sábado, 21 de janeiro de 2023

A TRANSIÇÃO ENERGÉTICA

Na realidade a probabilidade de nos mantermos abaixo de 2ºC da temperatura global é muito reduzida. Se tudo continuar na mesma, o mundo encaminha-se para um aquecimento de, pelo menos 3ºC até ao final do século Se mantivermos os níveis atuais de emissões globais, o orçamento de carbono, que nos resta para nos mantermos abaixo de 1,5ºC, esgotar-se-á dentro de seis anos.. De acordo com um inquérito recente das Nações Unidas, 64% da população mundial encara as alterações climáticas como uma emergência global. Então o que tem corrido mal até agora? Existe um problema fundamental no debate contemporâneo sobre as políticas climáticas: raramente aborda a desigualdade. As famílias mais pobres que emitem pouco CO2, anteveem corretamente maiores limitações à aquisição de energia. Já os decisores políticos temem represálias políticas, se impuserem medidas climáticas demasiado depressa. O problema deste círculo vicioso é que já nos fez perder demasiado tempo. A boa notícia é que podemos acabar com ele. Segundo dados de 2021, dez por cento da população que maior quantidade emite gases com efeito de estufa, é responsável por cerca de 30 toneladas anuais por pessoa, ao passo que metade mais pobre da população emite 1,5 toneladas anuais por pessoa. Ou seja: os 10% que mais emitem gases com efeito de estufa em todo o mundo são responsáveis por 50% de todas as emissões de gases com efeito de estufa, ao passo que metade mais pobre do mundo, apenas contribuiu com cerca de 12% da totalidade das emissões. Nas últimas três décadas, a parcela das emissões lançadas por 1% de emissões no pico da hierarquia(um grupo cinquenta vezes mais pequeno do que os 50% que compõem a metade menos emissora a nível global) passou de 9,5% para 12%. Quer isto dizer que embora, as desigualdades carbónicas ao nível global sejam colossais, o abismo entre o topo e o resto da população, tem vindo com o tempo, a aumentar.. Não se trata de uma mera divisão entre países ricos e pobres:.. existem emissores potentes nos países mais pobres e emissores muito fracos nos países ricos. Vejamos o exemplo dos EUA: os 50% de indivíduos mais pobres no seio da população norte -americana, emitem por ano cerca de dez toneladas de CO2 por pessoa, enquanto os 10%mais ricos emitem cerca de setenta e cinco toneladas por pessoa. Os ricos produzem um valor mais de sete vezes superior. O mesmo acontece na Europa, onde os 50% mais pobres emitem cerca de 5 toneladas por pessoa, ao passo que os 10% mais ricos emitem cerca de trinta toneladas um valor seis vezes superior.  As regiões mais pobres do mundo também exibem desigualdades significativas. De onde são oriundas essas desigualdades? Os ricos emitem mais carbono através de emissões diretas ( ou seja: o combustível com que abastecem os automóveis), mas também dos bens e serviços que consomem, bem como dos investimentos que fazem. Os grupos com rendimentos baixos emitem carbono, quando usam veículos ou aquecem as casas, contudo as suas emissões indiretas, ou seja, as relacionadas com as compras e os investimentos, são substancialmente mais baixas do que as dos ricos. Segundo o World Inequality Report (2023),   metade mais pobre da população em cada país do mundo, quase não possui meios financeiros, o que significa que tem muito pouco ou nenhuma responsabilidade nas emissões associadas às decisões de investimento. Devíamos reduzir as emissões? Sim devíamos, mas é evidente que alguns grupos terão de se esforçar mais do que outros. Os mais pobres têm menor capacidade de descarbonizar o seu consumo. A conclusão lógica é que os ricos têm de contribuir mais pra cortar nas emissões e tem que ser dada aos pobres a capacidade pra enfrentar a transição para 1,5ºC ou 2ºC. Mas, não é isto que está a acontecer, Alguns países já ameaçaram planos para reduzir significativamente as emissões até 2030. e, a maioria está a planear alcançar emissões nulas em termos líquidos perto de 2050. Centramo-nos no objetivo de reduzir as emissões até 2030: segundo um estudo recente, em termos per capita, a metade mais pobre da população dos EUA e da maioria dos países europeus, já alcançou este objetivo. Uma forma de reduzir as desigualdades carbónicas, passa por estabelecer direitos individuais de carbono, semelhantes a formatos usados por alguns países, para gerir recursos ambientais limitados. Por exemplo em França nos períodos de forte escassez de água, é possível proibir por completo o uso, que não seja estritamente essencial (para beber, saneamento ou cozinhar) de recursos hídricos. Eta medida visa nivelar o consumo de água de forma igual por toda a população. Pra acelerar a transição energética, precisamos de ideias inovadoras. Imaginemos por exemplo, um imposto progressivo sobre a riqueza com um suplemento para a poluição. Isto iria agilizar a eliminação dos combustíveis fósseis, porque tornava mais dispendioso o acesso ao capital por parte das indústrias de exploração de combustíveis fósseis, porque tornava ainda mais dispendioso o acesso ao capital por parte das indústrias de exploração de combustíveis fósseis. Oferece ainda a possibilidade de gerar vastos rendimentos para os governos, que poderiam ser investidos no setor da ecologia e da inovação. Estes impostos seriam mais equitativos, uma vez que recaem numa fração da população e não na maioria. Um imposto modelo sobre a riqueza aplicado aos multimilionários com um suplemento para a poluição podia gerar ao nível mundial, 1,7% do rendimento global. Este rendimento podia financiar o grosso dos investimentos adicionais necessários, todos os anos, ao cumprimento dos esforços de mitigação das alterações climáticas. Seja qual for o caminho seguido pelas sociedades, para acelerar a transição , está na hora de reconhecer que a descarbonização profunda não é possível sem uma redistribuição ainda mais profunda do rendimento e da riqueza.

domingo, 15 de janeiro de 2023

A INFLAÇÃO E A SUBIDA DOS JUROS

  Temos vindo a falar de uma crise: há desafios económicos que enfrentamos Tais desafios não se refletem na explosão do desemprego ou num descontrolo das contas públicas, mas em saltos brutais dos preços, acompanhados de um aperto monetário agressivo. Mesmo sem recessão, 2023 pode ser um ano de sofrimento para as famílias portuguesas: os juros já atingiram em cheio as prestações da casa, mas ainda não serão capazes de tirar-lhe dos ombros o peso da inflação que crescerá a um ritmo mais baixo, mas ainda muito elevado. A economia em 2023 será apertada por uma tenaz: inflação muito elevada, que pressionará os orçamentos das famílias, e, as margens de muitas empresas, juros com saltos inéditos que aumentarão as prestações do crédito e desincentivarão as empresas a investir. O consumo não contribui para o crescimento da economia em 2023, e, as exportações de serviços darão um contributo seis vezes menos do que em 2022. Haverá perdas de poder de compra. A partir da 2ªmetade de 2023, a atividade acelera, refletindo a expetativa de atenuação das tensões nos mercados energéticos, a recuperação gradual do rendimento real das famílias, a melhoria da procura externa e a normalização das cadeias de abastecimento globais. Portugal não estará sozinho nas dificuldades a enfrentar no ano de 2023. O pessimismo é transversal a todo o mundo desenvolvido. O FMI estima um crescimento de 2,7% da economia mundial com a zona euro, a ficar-se pelos 0,5%. Menos afetado pela crise energética, Portugal terminou 2022 com o segundo maior crescimento da zona euro. Para 2023, mesmo a estimativa mais pessimista (0,7% da Comissão Europeia) fica muito acima da média prevista pela mesma instituição para a zona euro(o,3%). A incerteza é no entanto, enorme e, estes valores não estão assim tão longe de uma estagnação ou contração do PIB. Na conjuntura atual, em que o PIB tem tido oscilações muito significativas, devido à rigidez das políticas sanitárias, devemos pensar numa recessão apenas, se o desemprego começar a aumentar de forma rápida. Para que isto aconteça, serão necessários alguns desenvolvimentos mais negativos do que o que prevemos, principalmente na guerra a leste e no mercado da energia. O Banco de Portugal fez uma espécie de stresse à economia mundial. Este cenário adverso traduz-se num corte total no fornecimento de gás e de petróleo russos à Europa e uma maior lentidão na substituição de fontes de energia. Implicaria racionamento e cortes de produção na Europa, o que afetaria outras cadeias de produção e abastecimento. O reflexo em Portugal, chegaria sob a forma da procura externa por bens nacionais e de uma penalização do turismo. O preço do petróleo aumentaria, assim como o gás que neste cenário dispararia. A conta de supermercado voltaria a aumentar muito e os juros subiriam mais do que se prevê atualmente. O mundo atravessa aquele que é provavelmente o mais abrangente apoio monetário de sempre, As subidas devem continuar em 2023, mas há muitas dúvidas se esse caminho está ser seguido com determinação suficiente, ou se, pelo contrário há excesso de zelo dos bancos contrário para compensar a tolerância com que agiram pré- 2022. Os bancos centrais esperam conseguir executar um número de equilibrismo: controlar os preços se atirar a economia para o charco. Chamam-lhe " aterragem suave" Neste ano, os efeitos das suas ações ficarão mais evidentes, à medida que os juros apertarem as famílias com créditos, provocarem falências de empresas e o agravamento do desemprego. Para os governos, é também um ambiente difícil de geris. Têm de apoiar a população num momento de maior fragilidade, mas serão censurados se forem demasiado longe, devido às preocupações com o equilíbrio das contas públicas, ou por estarem a contribuir para manter a inflação elevada ao estimularem a procura. O combate à inflação é o momento de encruzilhada deste ano e num contexto de mercado de trabalho, a prioridade deve estar na redução da dívida. A palavra que irá marcar o mercado de trabalho em 2023, irá ser a palavra "incerteza". É cada vez mais consensual que os salários irão crescer a um ritmo inferior à inflação. Esta é quase uma certeza, dúvida é qual será o montante real de poder de compra. Este depende de dois fatores: da evolução da inflação e da capacidade negocial dos trabalhadores e dos seus representantes em pressionarem as empresas para aumentos salariais mais elevados. Porém estes fatores não são independentes: um é causa e efeito do outro.. As taxas de juro vão continuar a subir, até que o atual ciclo inflacionista mostre uma inversão "robusta". É preciso subir os níveis de confiança e aproveitar as almofadas orçamentais para reagir às adversidades da atual conjuntura. A inflação é mais negativa para a economia do que a normalização das taxas de juro. Se não houver novos choques na economia, sobretudo nos preços internacionais da energia, a inflação mensal pode descer para 3% em 2023. Centeno diz que não há nenhum cenário base, de nenhuma instituição europeia que preveja recessão, nem para Portugal ou área do euro. Há uma desaceleração do crescimento. Sobre Portugal, Centeno aponta fragilidades como a grande proporção de crédito à taxa variável, e vantagens como a enorme redução do endividamento das famílias, das empresas e do Estado. Com uma situação de pleno emprego, este é o momento de todos os setores reduzirem a sus dívida e, com o risco bancário controlado, o endividamento em queda e a poupança das famílias a crescer é de não hesitar em usar as almofadas financeiras, se o contexto económico o exigir.