quinta-feira, 11 de junho de 2020

A CRISE ATUAL

O " Grande Confinamento" colocou a economia no congelador. Com toda a gente fechada em casa, o desafio era evitar ao máximo os despedimentos e as falências. Agora, Portugal prepara -se para uma segunda fase em que volta a ligar o interruptor da atividade económica. Porém, as empresas e os consumidores não se ligam só com um toque no botão.. O medo do vírus, as limitações ao turismo e os constrangimentos orçamentais, deverão impedir a aceleração de uma economia que está a funcionar com menos motores. Como poderá o Governo pô-la a voar?
Pode parecer paradoxal, mas o que vivemos até agora, foi a parte simples: mandar fechar. As medidas de apoio, apesar de dispendiosas, tinham como principal objetivo, assegurar a tesouraria das empresas no curto prazo. Daqui para a frente, as indicações serão mais problemáticas, e, as políticas económicas mais complexas de idealizar e de chegarem ao terreno. Vamos avançar, a regressar aos escritórios, mas devagar e à vez. Já podemos voltar a almoçar fora ,mas com dois metros de distância uns dos outros. Voltaremos ao cinema, mas só com lugares marcados e lotação limitada. Será, portanto, uma doença constante entre o desejo de voltar a ter uma economia que funcione, e, a necessidade de manter a pandemia controlada.
"O importante é que a nossa economia cresça o mais rápido possível", tendo como prioridades a transição energética, a economia circular, a redução das emissões de carbono, a digitalização e a reorientação da indústria, de forma a beneficiar da relocalização das grandes cadeias de valor.
A Comissão Europeia aponta um caminho semelhante para Portugal. "Será importante antecipar projetos de investimento público e promover o investimento privado através das reformas relevantes": considerou Bruxelas na avaliação da primavera, no âmbito do semestre europeu.
Além de investimentos para apoiar a inovação, a digitalização e a energia verde, é também sugerida uma aposta forte na ferrovia e noutras infraestruturas. As prioridades para fazer a economia avançar rumo a um crescimento sustentável, aparentam ser claras, mas executá-las será difícil, tanto ao nível de financiamento, como dos melhores instrumentos a utilizar.
O investimento público terá de ser sempre um pilar. No entanto, os últimos anos, mostram que esta é uma área em que o Governo tem tido dificuldades manifestas, falhando sempre por muito, as metas que foi inscrevendo nos orçamentos. Em 2019, por exemplo, conseguiu investir apenas 1,9% do PIB, longe dos 2,3%, programados no Orçamento do Estado. Portugal tem sido também um dos países europeus com o mais pequeno peso do investimento do Estado, na sua economia.
"Em qualquer recessão,  é normal que os governos tentem estabilizar o ciclo económico. Todos os países o fazem, e é o que tem sido feito nos últimos 100 anos nestas situações". "Alguns estudos para vários países da União Europeia ,mostram que o ganho agregado do investimento público é positivo".
Embora o investimento público seja mais vasto e diverso do que aquele que é feito via construção, é praticamente inevitável que esta, tenha um papel importante. O Governo parece achar que isso traz uma vantagem: a capacidade de absorver emprego que vai ser destruído em alguns setores , em especial a restauração e hotelaria.
Construção e restauração partilham algumas características. São dois setores de trabalho intensivo, com uma mão de obra pouco qualificada, alguma informalidade e salários baixos. Mas as diferenças também são óbvias; existe muita mão de obra feminina nos restaurantes, a qual obviamente, não fará uma transição para a construção civil. Não sei se as pessoas quererão fazê-lo, e ,se têm a capacidade técnica e psicológica para isso. Há quem aponte como possibilidades mais eficazes  para absorver a realização de inquéritos, os serviços de apoio social, ou certo tipo de atividades na saúde. A limpeza de florestas e uma renovada aposta na formação e na requalificação, também podem ser hipóteses.
Ricardo Paes Mamede, concorda que "não existe uma sobreposição perfeita entre trabalhadores dos setores mais afetados e o da construção" mas" há uma sobreposição parcial". Pela inevitável intensidade da mão de obra, é inevitável a construção ser ativada. E, apesar de talvez pensarmos automaticamente em betão, há opções mais sofisticadas. É fundamental que as apostas feitas, sejam no sentido de uma alteração estrutural, mais eficiência energética, transição digital e investimento na infraestrutura digital.
É pouco realista, pensar que as iniciativas do Governo são capazes de reduzir a totalidade do choque económico provocado pela Covid.-19, principalmente em setores mais expostos ao turismo, o qual continuará a sofrer com as limitações de movimento. É também pouco realista, esperar que as dificuldades dos restaurantes durem meia dúzia de meses, e, o mesmo para hotéis e algum comércio. A má notícia, é que o turismo, tem sido a principal força detrás do crescimento português nos últimos anos.
Mesmo se o resto do tecido empresarial recuperar totalmente- um grande "se"-, a economia terá de ser capaz de voar sem um dos seus motores.
É possível ,mas deverá ser uma viagem mais lenta. "A economia teve um motor nos últimos anos: o turismo. Ele agora desapareceu. Temos de encontrar outro. "Portugal não irá perder a sua vantagem competitiva, o sol, e as praias, mas a ideia de que será uma crise temporária que afetará apenas 2020-2021, não faz sentido. Onde iremos encontrar o crescimento?. Nas reconversões do têxtil e do calçado, a nanotecnologia no Porto e em Braga, os data centers da Covilhã, o cluster aeronáutico de Évora e o setor logístico. Estas reconversões não serão rápidas.
Como nos aguentaremos até lá?
Segundo Keynes, "no longo prazo", "estamos todos mortos". Se a situação não se repuser depressa, provavelmente acontecerá o mesmo do que na última crise. Não estou a ver uma situação fácil. O Estado é chamado a suprir falhas de rendimento, mas isto custa dinheiro. Se a economia não abrir rapidamente, esta situação poderá ser insustentável.
O problema é que essa abertura não está nas mãos de ninguém. Pode-se ligar o tal interruptor, mas lâmpadas só acendem quando querem, e, alguns fusíveis poderão estar queimados. Ora, é tão importante autorizar os restaurantes a abrirem, como é, as pessoas terem confiança para voltarem a um. Os nossos comportamentos estão diferentes e estamos a regressar à normalidade possível.
Restaurantes e hotéis continuam vazios pois do ponto de vista da saúde pública, corremos sérios riscos. É preciso abrir sem medo, com confiança. Mas essa confiança constrói-se, certificando-nos de que os passos que agora damos são seguros, e, que nos permitem avaliar que a reposição da nossa vida coletiva se faz com o controlo da doença.
Além das prioridades económicas estratégicas de longo prazo, nos primeiros tempos de relançamento, poderão ser direcionadas ajudas, para os setores mais afetados ,de forma a incentivar a confiança e proteger, na medida do possível, empregos e empresas.
O Governo admite reforçar o capital de algumas empresas, sem dificuldade e apoiar, a fundo perdido, a reconversão de empresas, com o objetivo de obedecer a novas regras de saúde e de segurança.
Os restaurantes, por exemplo, poderão ter de reestruturar a própria natureza do seu negócio, virando-se mais para o take-away, ou para entregas ao domicílio, ou há uma reconversão, ou alguns restaurantes não irão sobreviver. Portugal parte para esta batalha, ainda com outro handicap, além da dependência turística. Embora tenha atingido, um excedente orçamental em 2019, não reduziu muito a sua dívida pública, que continua a ser uma das mais elevadas da Europa. Terminou o ano passado, em 117% do PIB. O FMI estima que o rácio atinja os 135%, no final de 2020 um máximo histórico.
Com receio de uma repetição do filme da crise anterior, esse endividamento atua como um limite de velocidade na ambição de medidas orçamentais do Governo para lidar com a Covid. O complicado não parece ser delinear o plano de relançamento, mas sim, financiá-lo.
O nível de agressividade dessa intervenção estará muto dependente daquilo que acontecer na União Europeia. Um dos motivos para ainda não sabermos muito sobre os planos do Governo para a reabertura da Economia, é a indefinição na frente comunitária.
Embora já tenham presenciado a atuação rápida e significativa do BCE, a criação de um seguro de saúde de apoio ao emprego e a regulamentação do acesso a fundos do Mecanismo Europeu de Estabilidade, os Estados-membros, estão nesta altura a negociar um fundo de recuperação que servirá para estimular uma retoma simétrica que consiga igualar os pontos de partida, com que os diferentes países iniciam o esforço de recuperação. Os líderes das maiores economias do euro, dão sinais de quererem evitar uma nova crise existencial na UE, que facilmente se tornaria combustível para populismos e aumentaria o risco de desintegração. 
Temos de decidir se a UE é um projeto de mercado, ou um projeto político. Acredito que é um projeto político e nós precisamos de transferências e de solidariedade financeira.
Angela Merkel, defendeu também a necessidade de se agir no sentido de tirar a Europa desta crise. Porém, mesmo com a aparente vontade de os líderes europeus encontrarem soluções para relançar a economia dos países da UE, o processo de decisão é complexo.
A estratégia de relançamento terá em conta as prioridades e a diminuição do conjunto financeiro que o Governo terá à disposição. Mas, para ser eficaz, tem de se pensar também nas melhores formas de fazer chegar esses impulsos às empresas, que terão de ser a linha da frente na retoma.
A capacidade de investimento está a ficar comprometida, dificultando a regeneração económica. Se, numa primeira fase, muitas empresas sobreviverem com as medidas de liquidez, como as moratórias nos créditos e o adiamento no pagamento de impostos e as contribuições, teme-se que o que irá  acontecer, quando essas medidas saírem do terreno. Por mais apoios que possam vir da Europa, os recursos do Estado, serão sempre limitados, por uma crise desta dimensão. Depois de, na primeira fase, a estratégia ter sido a de disponibilizar liquidez a quase todos, no relançamento, deve-se evitar a todo o custo, criar empresas- zombies- que sobreviviam apenas porque têm apenas apoios públicos.
Numa estratégia de relançamento, o Estado tem de se preparar para uma onda gigante de reorganização e de liquidações de empresas que se aproxima rapidamente.
A rapidez e a eficiência em resolver esses processos, serão essenciais na recuperação da economia e na realocação de recursos e de capital humano aos setores com oportunidades de crescimento. A destruição provocada pela pandemia, foi brusca, e há empresas que não conseguem evitar a tal queda no precipício.
A missão é fazer com que a economia não siga pelo mesmo caminho. A tarefa não é fácil, porque há motores que não respondem, e, muito provavelmente, não será tão cedo que  conseguiremos regressar à velocidade de cruzeiro.
Até que a ciência consiga dar resposta que trave o medo relativamente ao vírus, teremos de continuar com momentos de emergência para impedir nova queda a pique da economia. E isso, requer ventos favoráveis vindos da União Europeia.
A paralisação das exportações atingiu quase todos os setores em Portugal. Com o confinamento, o valor exportado pelo País teve uma quebra de 17,1% na primeira metade do ano, em relação ao mesmo período de 2019. Desceu de 30,4 milhões para 25,2 mil milhões de euros, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE).
A crise atingiu fortemente setores muito relevantes para a economia nacional, criando mais pressão sobre o PIB  nacional. As de produtos do setor automóvel para outros mercados, passaram a 17% mais de 1,5 mil milhões de euros, ma primeira metade do ano. E a globalização da atividade mundial resultou numa quebra de 28%, quase  460 milhões nas exportações de produtos petrolíferos.
Mas nem todos os bens" made" in Portugal ficaram à espera de comprador..
Dada a natureza da crise que atravessamos, que os produtos farmacêuticos tendam a ser os bens portugueses com maior aumento da procura externa.. Neste caso, as exportações subiram mais de 20% para 647,4 milhões de euros, segundo os dados do INE.
A Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), não recolhe dados sobre os produtos específicos em que  mais aumentou o volume de exportação, sendo os maiores destinos os bens produzidos pelas farmacêuticas portuguesas, os mercados
 europeu e americano. E, afirma que que "a internacionalização e a exportação têm sido dois grandes desafios da indústria farmacêutica de base produtiva nacional, nos últimos anos. Refere ainda que "as empresas portuguesas são hoje reconhecidas em todo o mundo, como fornecedores de excelência de produtos de serviço de saúde"., A associação salienta o impacto que o projeto Pharma Portugal criado em 2005 entre algumas empresas do setor, o Infarmed e a AICEP, teve na "estratégia de inovação e competitividade, para reforçar a capacidade de internacionalização".
Mas não foi apenas o setor farmacêutico a subir vendas para o exterior. Numa crise em que houve destruição de cadeias de abastecimento e se colocou à prova a capacidade dos países assegurarem o fornecimento de produtos essenciais, também os bens agrícolas de origem animal foram mais procurados. Os produtos mais exportados em valor são os pequenos frutos, principalmente a framboesa, o tomate processado, a laranja e a pera.
O setor exportou para 133 países, principalmente para o mercado da União Europeia, que absorveu 78% do valor. Na UE, os principais mercados são Espanha França, Holanda e Alemanha. entre os países terceiros, destacando o Reino Unido , Brasil e Angola. Toda a cadeia agroalimentar, não parou e isso foi fundamental para conseguirmos manter um bom nível  das nossas exportações, embora com menor crescimento, no segundo trimestre. Também, os consumidores europeus mantiveram uma elevada procura de produtos frescos e saudáveis, a fim de mantermos uma dieta equilibrada. Também os bens alimentares acompanham este movimento da subida das exportações.
  Esse esforço de diversificação foi importante, já que muitos dos mercados mais próximos e tradicionais , foram também atingidos por confinamentos rigorosos. As exportações para Espanha, o maior parceiro comercial do País, caíram mais de 16%, correspondente a 1,25 mil milhões de euros, no primeiro semestre. Para a Alemanha, a quebra foi de quase 700milhões de euros, e, para França desceram mais de 600milhões.. Apesar de os mercados mais importantes para a economia nacional, terem travado a fundo, houve geografias onde as empresas portuguesas conseguiram aumentar as vendas. E, se apenas alguns desses destinos estão na Europa, caso da Irlanda que comprou 43,9 milhões a Portugal, outros ficaram em paragens mais remotas.
As exportações para Taiwan, Japão e Coreia do Sul aumentaram mis de 30 % no primeiro semestre, face ao mesmo período do ano anterior. Em valores nominais, as subidas para esses mercados oscilaram entre 20milhões e 30 milhões de euros. O volume pode ainda não ser  muito significativo, mas é um reflexo de aposta cada vez mais forte que alguns setores estão ainda a fazer em mercados da UE. É  de referir que, apesar do Velho Continente ser o maior destino das frutas e legumes e flores produzidas em Portugal, os mercados asiáticos, nomeadamente a China, a Índia e a Indonésia, são mesmo mercados, nos quais pretendemos continuar a apostar nos próximos anos. Além daqueles, as exportações para a Dinamarca e Israel, também não quebraram. Segundo o INE, as perspetivas dos empresários portugueses, relativas às exportações de 2020, não são muito animadoras. Para o total dos anos, a expetativa é a de que desçam 13% devido aos efeitos associados ao Covid. De acordo com o INE, 14,2%  das empresas pretendem alterar a sua estratégia de produção e de exportação. Entre as principais táticas para mitigar o efeito da crise, estão a diversificação de mercados de destino, o recentrar das exportações nos mercados da UE ou a mudança de fornecedores. Irão continuar a surgir mais oportunidades de exportação e internacionalização para as empresas portuguesas. A estratégia passa agora por consolidar os clientes existentes e maximizar os contactos efetuados nos últimos anos, nas feiras internacionais e de prospeção. Num contexto de elevada incerteza, quanto à retoma da atividade económica, fora da UE, alguns setores da economia portuguesa, podem se ativados, pelo menos temporariamente, para abastecer os mercados da UE, substituindo os respetivos fornecedores de origem extracomunitária. Este fenómeno é conhecido com um efeito de desvio de comércio e cria-se uma oportunidade importante para que as empresas portuguesas, absorvam competências, no curto prazo, ganhem escala e consigam afirmar-se no contexto europeu, mo médio e longo prazo. O GEE, defende que, apesar do País não ser a escolha mais óbvia, apresenta alguma especialização e capacidade instaladas, que lhe podem permitir, com alguma prospeção de mercado, e aproveitar algumas oportunidades de exportação, por via do comércio. Nesse conjunto, estão a indústria alimentar e de bebidas, no mobiliário, máquinas e equipamentos, agricultura , pescas e silvicultura. No entanto, essas eventuais oportunidades, estarão dependentes do grau de adaptabilidade das linhas de produção na indústria, da celeridade na entrega das encomendas, incluindo a escolha de parceiros logísticos, da criação de sinergias, da criação de sinergias industriais, para garantir escala suficiente, capaz de responder ao desafio da procura externa, acrescida, mas também da perceção de risco, associado ao país e à estabilidade da cadeia de produção. A recuperação esperada das exportações é mais lenta do que a observada na sequência dos recursos anteriores, o que reflete as tensões comerciais existentes, e, sobretudo o comportamento das exportações de turismo, cujo peso aumentou significativamente, nos últimos anos, e que deverão ser particularmente afetadas, e de forma persistente pela crise pandémica, segundo o Banco de Portugal, no último Boletim Económico. A crise económica e social, em Portugal, irá agravar-se, quando o Estado tiver de começar a travar as ajudas ao rendimento e a aumentar a carga fiscal, em virtude de uma situação das finanças públicas, em que os números hoje prevalecentes, não são sustentáveis. Ainda se acentuará mais , quando o Banco Central Europeu, começar a normalizar a sua política monetária, impondo alguns tipos de subida de taxas de juro, arrastando em conformidade as taxas de juro a que os Estados da área do euro, têm vindo a financiar-se nos mercados (taxas negativas nos prazos mais curtos). É absolutamente crítico neste processo que Portugal, acompanhando a subida das taxas de juro de referência, impostos aos países da mais baixo risco, não deixe aumentar o nosso prémio de risco, pela condução de qualquer política financeira que agrave a perceção dos mercados, no que se refere à solvabilidade do Estado Português.. foi o agravamento deste prémio de risco e a posição em que nos deixamos isolar, de um défice público, que chegou a superar os 11% do PIB, que determinou a crise financeira do nosso país em 2011 e anos seguintes. A crise económica e social ainda se agravará mais, quando começarem a ser levantadas as moratórias de que hoje beneficia uma boa parte do crédito bancário a empresas e a particulares, pois Portugal é o terceiro  Estado -membro, com maior percentagem de crédito bancário protegido por moratórias. Quando se regressar a algum tipo de normalidade em matéria de rendas e estabelecimentos comerciais, pondo termo à quase normalização dos centos comerciais, decretada no início da pandemia, a crise económica e social, ainda se acentuará mais. Com resiliência, capacidade e superação, Portugal irá vencer a crise.













segunda-feira, 25 de maio de 2020

QUE FUTURO TEM O FUTURO?

A manter tudo ma mesma- business as usual- o futuro não tem futuro. Trata -se de olhar para a realidade. Sabemos hoje que o mesmo sistema que produziu coisas tão importantes- como a evolução tecnológica e científica, o aumento da esperança de de vida e de bem-estar para tanta gente e reduzir o número de pessoas em pobreza extrema entrou num inadequado descontrolo coercivo, passando a criar mais problemas do que os consegue resolver. A crise ambiental global, associada ao acentuar das desigualdades sociais, ameaçam hoje a paz e a sobrevivência da Humanidade no planeta.
Se os acordos do GATT de 1994, que criaram a Organização Mundial do Comércio (OMC), tivessem integrado o respeito pelas condições ambientais e humanas, na regulação do comércio internacional, a concorrência teria sido mais leal e a globalização teria garantido alguma justiça e equilíbrio. É o que terá de acontecer agora.
Não será, pois, com mais do mesmo que o futuro poderá ter futuro. Mas mudar agora é principalmente mudar o quê? Comecemos pela descarbonização e pela energia. A queima de combustíveis fósseis, terá mesmo de declinar de forma súbita, na linha de que propõe o Pacto Ecológico Europeu.
As grandes crises de saúde pública, geradas pela poluição atmosférica, e que nos tornam mais vulneráveis, incluindo o Covid -19, ficaram agora evidentes e obrigarão a mudanças rápidas, mesmo nos países mais renitentes.
Milão e outras cidades europeias, já se estão a organizar nesse sentido, criando mais espaços verdes, livres de automóveis e desincentivando o trânsito motorizado. A Lisboa Capital Verde, começou a fazê-lo e seguramente irá fazê-lo muito mais.
Hoje  já é possível diversificar e aumentar as fontes de energia limpa, permitindo aos cidadãos viver de uma forma elaboradamente mais simples, sustentável e mais justa.
Se isso acontecer, assistiremos num futuro relativamente próximo, a mudanças visíveis a vários níveis das nossas vidas. Desde logo, nos sistemas de mobilidade com a sua eletrificação pública e privada, incluindo os pesados de mercadorias e navios, os que, ao contrário da aviação, se encontram já em processo de transição energética. Além disto, em áreas crescentes e, em número cada vez maior de habitantes ou comunidades residenciais, a gestão da energia limpa- integrando produção e consumo em redes inteligentes- vai tornar-se frequente, pois a lei já o permite e muitas autarquias o irão adotar . Portugal, sendo o país europeu com maior úmero de horas solares por ano, irá asim deixar de ser um dos países onde as populações menos usufruem de painéis solares térmicos e fotovoltaicos, como agora acontece.
E nem é preciso inventar nada. Basta agir politicamente a tempo e horas no momento certo: criar incentivos fiscais, não para os fósseis, mas para os renováveis e a sua expansão descentralizada a toda a sociedade; combater seriamente a pobreza energética, preparando as habitações para resistirem às condições extremas, a que todos vamos estar sujeitos com o aumento da frequência e intensidade das ondas de calor e frio.
Eficiência energética para todos, significará poupança certa da fatura energética das famílias e do país e melhor saúde pública.
Será uma oportunidade para multiplicar empregos e avançar com a requalificação a sério, e, não apenas do parque habitacional, cujo isolamento térmico será fundamental para resistir a novas crises pandémicas e climáticas.
O documento europeu Fundo da Transição Justa que determina os futuros investimentos, no quadro da União Europeia terá de ser aplicado nesta grande tarefa.
Mesmo que consigamos" baixar a curva " das emissões, teremos sem dúvida de nos adaptar a muitas coisas, pois as alterações climáticas, já nos estão a trazer novas crises. O país tem pontos críticos de alta vulnerabilidade.
No litoral, será preciso inverter totalmente a forma da sua ocupação, suspendendo as absurdas pretensões urbanísticas para as zonas costeiras que ainda hoje se assinalam, por vezes em dunas primárias como em Matosinhos ou em Troía, isto é: são apenas dois exemplos. Mas também poderíamos falar no Algarve, ou até na frente Tejo em Lisboa e Oeiras, agravando o risco ambiental de desfigurando as cidades. 
Há também uma extrema vulnerabilidade aos incêndios florestais que, para não se tornarem devastadores obrigarão a a políticas de ordenamento florestal e territorial drásticas.
Teremos finalmente de completar o quadro, instalar vastos dispositivos de deteção e combate precoce, e, mobilizar civicamente o país articulando as Forças Armadas, com outras estruturas(bombeiros, polícias e criando até algo, como um novo serviço cívico educativo.
A terceira grande vulnerabilidade são as secas e avanço da desertificação a sul e interior, a que se associa o problema da redução dos caudais dos rios internacionais e a sua falta de monotorização.
A revisão da Convenção de Albufeira será inevitável, tal como a elaboração dos planos de seca, e a contenção dos perímetros de rega e usos desadequados de água no Alqueva, no Mira e noutros. No curto prazo, serão criadas várias fábricas de água para a sua reutilização, tanto em cidades, como em zonas agrícolas.
A agricultura terá um papel muito destacado no nosso futuro sustentável, multiplicando os sistemas de proteção, integrada e biológica em cadeias curtas entre produção e consumo- "do prato ao prado" como
propõe do Pacto Ecolóogico.
Todas estas grandes mudanças originarão também uma mudança na valorização do território e das paisagens.
As áreas protegidas e os ecossistemas nacionais, são o nosso garante de coisas vitais - da saúde pública à biodiversidade, aos recursos vitais, como a água, solo e ar.
O futuro do terreno não irá assentar na insustentabilidade, e Portugal terá ótimos recursos para turismos muito diferentes, como por exemplo , de saúde, termal, ecológico, bem -estar, reabilitação, estimulando a investigação científica.
Tudo isto, trará não só novos e sobretudo melhores empregos. Grandes mudanças irão, pois atravessar os nossos hábitos, e, tal como sabemos experiências anteriores, num instante se tornam no novo normal
Foi assim que nos habituamos aos telemóveis, à inovação led,  abandonar os sacos de plástico, ao teletrabalho...
A economia circular irá alterar positivamente a nossa ideia arcaica de "lixo" - se estes fossem todos utilizados, só a UE, pouparia 355 dos recursos naturais que usa. Acima de tudo, os plásticos não só se limitarão ao indispensável, como darão origem a sofisticadas indústrias de grande input tecnológico e científico para a sua transformação.
Em todos estes futuros desejáveis e possíveis, cinco coisas estarão transversalmente presentes.
Uma é o papel da ciência e do conhecimento, aplicado e fundamental) que terá de ser muito reforçado e independente, como se viu nesta pandemia.
Outra é o papel dos jovens que já mostraram o seu potencial dinâmico e manterão a sua voz, bem audível e ação visível- veja -se as centenas de jovens que já estão mobilizados para ajudar a continuar a "Grande Muralha Verde" de África, plantando um milhão de árvores, para impedir que o deserto  do Sara avance. Um terceiro aspeto será o empenho coletivo no combate às alterações climáticas e à ruína da biodiversidade, pois como também se vive com a pandemia, prevenir é melhor do que enfrentar com consequências. que pode ser destruidoras. Um quatro aspeto, é o da equidade e da justiça, combate às desigualdades e à pobreza Por fim, o futuro não poderá escapar a uma decisão inevitável; acabar com a batota criminosa dos offshores, que inviabiliza qualquer projeto de sustentabilidade e civilização.
Portugal é o 3º país da UE, com mais dinheiro em offshores, seja de formas privadas, seja de empresas.
Nenhum país sobrevive a ser roubado por dentro.
De resto, no futuro, a Europa que alguns quiseram ver destruída, irá conseguir "pôr o homem na lua "com o Pacto Ecológico e Fundo de Transição Justa, e a harmonização da política fiscal entre os países, para acabar com a concorrência desleal e com os vistos gold. Na Europa e no mundo, um novo Estado social, será reconhecido, não como um abuso sobre a iniciativa privada, mas como uma expressão de civilização.
Os Governos, autarquias, ONG e empresas, irão movimentar-se para se conseguir atingir as metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, lançados pela ONU,até 2030. Iremos viajar menos, teltrabalhar mais, criar novas rotinas de mobilidade, de produção e de consumo. A Europa encontrará um novo Green Deal, um fator de unidade e prosperidade não só para o estado Atlântico, mas também para o Sul Global. O futuro do futuro é com todos, se excluir ninguém.



terça-feira, 19 de maio de 2020

A ERA DA DESGLOBALIZAÇÃO

A Comissão Europeia prepara-se para uma redefinição do conceito de globalização. E, para muitas empresas ficou evidente de que depender da produção de um bem na outra parte do mundo, para manter a atividade é um sistema que pode ter falhas. "Esta crise, veio de facto, expor a excessiva dependência que temos de outras geografias e do fornecimento de bens, até de alguns serviços, que foram deslocalizados nos últimos anos para outras zonas geográficas, nomeadamente para a Ásia.
O Presidente da Confederação Empresarial de Portugal, defende que "a União Europeia deve implementar uma reindustrialização estratégica, dando a cada Estado - membro, de acordo com as suas especialidades e desenvolvimento, as suas competências naturais, produções próprias, de forma a trocar importações por fabrico interno". Nas últimas décadas, o processo de globalização  levou à desindustrialização de muitos países europeus e mesmo dos EUA. Criaram -se cadeias de valor , em que o Sol não se põe, e, muito complexas.
A China e outros países asiáticos tornaram-se numa espécie de loja do mundo. Numa situação de crise, em que fiquem paralisadas algumas regiões asiáticas ou os transportes de mercadorias, basta faltar essa peça na engrenagem para muitas empresas pararem.
Aliás, ainda antes de a pandemia chegar à Europa, já não havia uma preocupação, em relação ao impacto que o confinamento na China iria criar no comércio e na economia internacional. "Se determinado componente é produzido num país e se esse estiver numa crise, toda a cadeia para e isso levará as empresas a regressarem a cadeias de valor regionais"
Além da questão das cadeias de valor, a Europa e também os EUA, tornaram-se dependentes da China, para conseguirem ter acesso a bens essenciais.
O exemplo mais extremo é a corrida que existe entre os países ocidentais para convencerem fornecedores chineses a venderem -lhes material e equipamentos médicos essenciais no combate à pandemia. Agora, a regra para grande parte dos países ocidentais poderá passar a  trazer mais atividade industrial para dentro de portas, "especialmente em áreas críticas e essenciais, como as farmacêuticas, defesa, infraestruturas de saúde e tecnologia"sublinha Robin Parbrook, gestor da Schroderes, numa nota aos investidores.
Bruxelas tem dado sinais fortes de que irá seguir esse caminho. Depois de a China ter ganho influência em empresas estratégicas como a EDP e a REN por exemplo, desta vez a Comissão Europeia quer impedir que o Estado Chinês faça o mesmo. Margrethe Vestager, vice -presidente da Comissão Europeia e que tem o pelouro da concorrência, deu luz verde aos governos europeus para entrarem no capital das empresas, de forma a impedirem compras a preços de saldo, por parte de entidades relacionadas com Pequim.
Apesar do caminho da desglobalização e da reindustrialização, se ter tornado mais evidente, por causa da pandemia, esse processo já tem vindo a ganhar forma mesmo antes da Covid . "Esta ideia não é nova, nem é apenas consequência desta crise. Recorde -se que uma das primeiras linhas políticas desta nova Comissão Europeia, foi precisamente  iniciar um processo de reindustrialização da Europa, assente nas valências de cada Estado -membro, com grande enfoque na inovação, na digitalização, e, sem esquecer as novas exigências que se colocam em termos de economia verde e da reutilização de recursos.
A pandemia pode agora fazer acelerar esse processo. Patrick Artus acredita que isso resulta numa maior reindustrialização em países como os EUA, o Reino Unido, a França e a Espanha. A consequência é que as economias mais exportadoras e que servem como as lojas do mundo, como a chinesa ou a alemã, tenham de se desindustrializar. No entanto, essa evolução não acontecerá de um dia para o ouro, e as cadeias globais não serão cortadas pela raiz. Obviamente não deixaremos de ter cadeias globais de abastecimento, nem tão pouco faço a apologia da implementação de medidas de cariz protecionista. Mas é essencial, diminuirmos a excessiva dependência que temos de algumas geografias, não só produzindo internamente , como diversificando as cadeias de abastecimento. O caminho é para uma globalização cada vez mais moderada. Para a economia Ptrick Artus antevê que isso possa trazer mais inflação, já que os produtos ficarão mais caros, por não serem fabricados em países com mão-de -obra barata. Outra das possíveis consequências, será um reequilíbrio das balanças comerciais e de pagamentos. A curto e médio prazos, vamos ficar com a ideia de que" tudo pode mudar". É difícil que essa incerteza acrescida não tenha condicionado comportamentos. Perante uma economia virada de cabeça para baixo, em poucas semanas, será que a"geração Covid" irá valorizar mais a segurança, nas suas várias dimensões do trabalho aos apoios sociais? A geração" Z" será capaz de dizer. Por cá, ao assistirem ao perigo do colapso do SNS, os jovens da geração "Z" exigirão o seu reforço?
Ao verem os pais sem rendimentos, ou eles próprios sem trabalho, como olharão para os vínculos precários - Portugal tem um dos níveis mais altos da Europa- e para as condições de trabalho na gig economy? Novos apoios sociais abrangentes, aumentarão a pressão por problemas mais generosos?
Nos EUA, onde temos mais dados e inquéritos, sabemos  que a geração "Z", nascida a partir dos meados dos anos 90, a dizer mais progressista do que a anterior, os millenials que, por sua vez, já tinham uma visão menos conservadora do que os pais e os avós. Setenta por cento dos "Z" norte -americanos acham que o governo deve fazer mais para solucionar os problemas dos país, em vez de deixar a sua resolução para empresas e indivíduos. Essa percentagem é de 49% entre os baby boomers nascidos no pós II Guerra Mundial. Esta atitude dos mais novos não surpreende, Serão eles, provavelmente, os mais prejudicados por esta crise, e, seja pela informalidade do vínculo, ou pela carreira curta, muitos deles, não  têm acesso a subsídio de desemprego. Num estudo sobre o Reino Unido, concluía -se que o grupo com maior perda de rendimentos durante a pandemia, corresponde a esta descrição: homens jovens a trabalhar numa pequena empresa. Tal como nos ensinou a crise anterior, gerações que passam por um grande choque económico, ficam com cicatrizes que podem nunca desaparecer. A cicatriz do medo e da falta de confiança no futuro, irá prejudicar a saúde psicológica das pessoas, especificamente nas famílias que têm menos recursos, e terá consequências drásticas para uma geração de crianças educadas em casa.